CAPPANARI, Silvana – Psicóloga, Terapeuta, Mediadora. Coordenadora da CLIFAM.
CRONEMBERGER, Lucia Fialho Assistente Social, Socióloga e Mediadora.
Como em todas as organizações sociais, a família vive profundas transformações na cultura das suas relações. Mudanças estas que vem exigindo, não só, novos parâmetros de reorganização através das separações, divórcios e recasamentos, mas acima de tudo na maneira de processar as redefinições nestas relações. Como compomos ou construímos nossos relacionamentos? Quais os nossos valores, e como nos flexibilizamos para enfrentarmos os impactos das mudanças? Como nos relacionamos com o diferente? Numa postura de inclusão ou exclusão?
Como profissionais na área de saúde mental e no trabalho cotidiano com famílias, cujas dificuldades pelas quais estão passando as impedem de fluir nos seus processos de crescimento, tanto de seus membros como no seu próprio sistema de relação, somos partidárias da crença de que através de conversas podemos construir novos caminhos para as questões conflitivas. Nesse sentido, temos trabalhado com outros profissionais de diversas áreas, na Mediação.
Esta técnica, embora velha conhecida em algumas culturas como a chinesa, americana e outras, vem se estabelecendo em nosso meio como uma via eficaz de resolução de conflitos nas mais diversas áreas : familiar, escolar, trabalhista, comercial, empresarial, etc.
A partir da década de 70, a Mediação vem se firmando como um dos Métodos de Resolução Alternativa de Disputa (RAD), uma forma mais econômica e menos desgastante, que pode evitar o litígio e o moroso sistema judicial.
Existem vários modelos de Mediação, mas aqui estamos nos referindo a Mediação transformativa, por nós utilizada no trabalho com famílias, onde os indivíduos, mesmo tendo interesses divergentes, necessitam ou desejam permanecer em contato após a resolução do conflito. A Mediação transformativa, privilegia o restabelecimento da relação entre as pessoas envolvidas nos conflitos, sendo o acordo entre elas, uma das possibilidades.
A Mediação, como uma das práticas de resolução alternativa de conflito, é por nós entendida como um processo conversacional, voluntário, confidencial, onde um terceiro, neutro e imparcial, o mediador, ajuda as pessoas envolvidas em conflito a flexibilizarem este sistema conciliando seus interesses e se possível, chegando a um resultado mutuamente aceitável, auxiliando-as no restabelecimento de suas relações.
Como guardião deste processo, o mediador, busca criar um contexto que propicie a transformação de um clima competitivo em um clima colaborativo. Na criação deste contexto e em todo o processo de transformação comunicacional entre as partes, o mediador lança mão de instrumentos e técnicas advindos de outras áreas do conhecimento, que vão ajudar as partes e o próprio mediador a escutarem, ampliarem a percepção, perguntarem, falarem e se envolverem no processo dialógico de comunicação. A aplicação, o objetivo e o alcance das técnicas dependem do contexto e da arte de aplicá-las.
Entendendo conflito como um processo complexo, podemos pensa-lo como uma sucessão de etapas que ocorre no decorrer das interações, construído pelas partes a partir de diferenças entre elas. A disputa é por nós entendida como uma das etapas deste processo.
A Mediação como uma forma alternativa de dissolução de conflitos, se bem conduzida, leva as pessoas, neles envolvidas, não só a considerarem e admitirem a sua participação no processo conflituoso mas também a participarem de forma responsável na busca de soluções próprias e efetivas dos mesmos, reconhecendo e legitimando a participação do outro.
Pautadas na nossa experiência, como profissionais no trabalho com famílias, identificamos a Mediação como muito útil nos casos de separação conjugal; de brigas entre irmãos ou entre pais e filhos em questões relativas a visita, pensão, adoção e guarda de filhos; de divisão de herança e responsabilidades; de cuidados com familiares portadores de doenças crônicas e/ou idosos; de sucessão e dissolução de empresas familiares; de questões educacionais e comunitárias entre outras. Por estas e outras possibilidades, é que imaginamos ser a Mediação, do interesse dos clínicos, como mais um recurso disponível no trabalho com sistemas em crise.
Na condução da Mediação – diferente e complementar ao processo terapêutico – embora o profissional mediador leve em consideração os aspectos psicológicos e emocionais como um dado de realidade, não tem como proposta trabalha-los em si mas inclui-los de forma que as pessoas envolvidas na disputa se sintam legitimadas e atendidas nos seus interesses para uma possível retomada das negociações. O mediador familiar, como um especialista nas questões desta área, funciona como um agente de realidade, cuidando para que os acordos sejam viáveis ao longo do tempo.
Por promover a aprendizagem da escuta, o respeito pelo outro, a valorização das diferenças, além da criação de padrões de comunicação, a Mediação Transformativa possibilita às pessoas: uma nova maneira de conversarem sobre suas diferenças; identificarem suas necessidades e buscarem soluções para impasses; ampliarem a visão de si mesmas, das outras e da situação; a se responsabilizarem e se comprometerem pelos acordos efetivados e aprenderem a negociar a resolução de problemas futuros.
Acreditamos que estes benefícios gerem condições fundamentais para a prevenção da cronicidade dos conflitos.
Referências Bibliográficas
Schnitman, Dora Fried e Littlejohn, Stephen (Organizadores) – Novos Paradigmas em Mediação – Artmed editora – Porto Alegre – 1999
Leonel, Carla (Coord.) – Casamento, Separação e Viuvez – Seus Direitos, Seus Deveres; Mitos e Verdades – Ed. CIP – 1999
Gottheil, Julio e Schiffrin, Adriana – Mediacion, una Transformacion en la Cultura – Paidós – Argentina
Haynes, John M. e Marodin, Marilene – Fundamentos da Mediação Familiar – Ed. Artes Médicas Sul Ldtda. – 1996
Suares, Marinés: Mediación. Conducción de disputas, comunicación y técnicas – Paidós, Buenos Aires, 1997
Cappanari, S; Cronemberger, L; Bernardes, C; Yazbek, V. “É Possível Evitar a Cronicidade do Conflito Litigioso?”. Anais do III Congresso Ibero-Americano de Psicologia Jurídica. – São Paulo: U.P.Mackenzie, 2000.
__________. “Mediação Transformativa: Uma Experiência de Mudança de Paradigma”. Anais do III Congresso Ibero-Americano de Psicologia Jurídica. – São Paulo: U.P. Mackenzie, 2000.
Iniciei um curso recentemente sobre Mediação e pesquisando sobre a Mediação Transformativa encontrei o artigo de vocês, o que me ajudou muito. Parabéns pelo trabalho. Abs, Regina.
Boa noite
Tenho um olhar especial pela mediação transformativa , fiz meu primeiro curso com a Vania Yasbek e aprendi muito, muito e pela minha formação e atendimento com famílias o resultado é muito satisfatório .
Agradeço o artigo e vou enviar aos meus alunos do curso de mediação; é de grande contribuição.
Abraços e em especial a Vania.